Caça-vacinas agora estão em busca de doses da Janssen na cidade de São Paulo
Procura pelo imunizante de dose única provocou a recusa até da Pfizer na capital paulista, nesta segunda-feira (28)
Se até a semana passada uma das perguntas mais ouvidas pelos profissionais de saúde nos pontos de vacinação da cidade de São Paulo era “tem vacina da Pfizer?”, agora a questão passou a ser “tem vacina da Janssen?”
Em visita a cinco pontos de vacinação da cidade de São Paulo na manhã desta segunda-feira, quando teve início a imunização de pessoas de 46 anos, a reportagem constatou que, ante a negativa, alguns lamentavam, viravam costas e iam embora. A maioria, entretanto, continuou na fila, independentemente da resposta que receberam.
Um deles foi o numismata Gabriel Nunes, de 46 anos, uma das cerca de 60 pessoas que estavam na fila da UBS Belenzinho - Marcus Wolosker, na zona leste. Já prevendo que a fila seria grande, ele levou o livro que está lendo para passar o tempo. Ao chegar, nem perguntou qual era a vacina disponível. Ao ouvir que o imunizante distribuído era o da Janssen, relativizou. “Quando a gente era moleque não perguntava quem fabricou a vacina. O importante é tomar. Bom saber que não precisarei voltar”, disse.
Nem todos pensam assim. É o caso do construtor e árbitro amador Sandro Tavares, 51. Ele já adiantou que não queria se vacinar de jeito nenhum por não acreditar em vacinas. Porém, como planeja viajar em breve, foi até a UBS Nossa Senhora do Brasil, na Bela Vista (centro) em busca do imunizante de dose única. Ao saber que a vacina da Janssen havia acabado, mostrou irritação, virou as costas e falou palavrões contra “o governo”.
A vacina foi o primeiro a ser aprovada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) com o regime de imunização de apenas uma dose. O Brasil já recebeu 3 milhões de doses da Janssen, divididos em três lotes. A autorização temporária para uso emergencial da vacina contra a Covid-19 foi aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no dia 31 de março. No estado de São Paulo, a cidade de São Caetano do Sul (ABC) foi a primeira a usar o imunizante.
Segundo profissionais de saúde que atuam nos pontos de vacinação, algumas pessoas chegam a sair da fila quando descobrem que o imunizante da Janssen havia acabado. Foi o que aconteceu, por exemplo, na UBS Jardim Vera Cruz, em Perdizes (zona oeste), por volta das 12h. Um homem chegou a ser atendido na triagem, e, ao ser informado lá que o imunizante da Janssen havia acabado, desistiu de se vacinar. Ao ser abordado pela reportagem, ele não quis dar entrevista.
Ainda na UBS Jardim Vera Cruz, a nutricionista Claudia Garcia Cellare, 55, que já tomou as duas doses da vacina, foi acompanhar o filho, o estudante Pedro Garcia, de 18 anos, portador de asma crônica e que se vacinou nesta segunda-feira devido a essa comorbidade.
Visivelmente emocionada, ela disse ter lembrado de sua tia, morta vítima de Covid-19. “A vacina dela estava marcada para a segunda. Ela internou na sexta e morreu”, disse.
Claudia disse que todas as vacinas são válidas e que o filho tomaria a que estivesse disponível. Entretanto, defende que os estudantes sejam imunizados com a da Janssen para que as aulas presenciais voltem sem barreiras.
O arquiteto Rodrigo Sklevtiz, 49, que foi até a UBS Humaitá, na Bela Vista (centro), por volta das 13h30, também disse que todas as vacinas são ótimas. Entretanto, ele já poderia ter se vacinado na semana passada, e não o fez por escolha, segundo disse. “Esperei até agora, não foi? Então não custa nada esperar mais alguns dias. Acho todas as vacinas ótimas, excelentes. Mas se eu posso tomar uma dose só. Já resolvo tudo de uma vez. Amanhã [terça] eu tento de novo”, afirmou.
Ao lado dele, o empresário do ramo de transportes Lucas Ferraz, 46, disse que a UBS Humaitá foi o terceiro ponto de vacinação que procurou para ser imunizado nesta segunda-feira. Ele disse que chegou a ir em uma unidade da zona sul que dispunha de Pfizer, a “queridinha” dos “caça-vacinas” até a semana passada, e também irá aguardar pela Janssen. “Escreve aí. Eu não tenho nada contra não. Mas se estão dando essa outra, por qual motivo eu não vou tomar?”, questiona.