Amor Perfeito: intérprete de Jesus Cristo elege cena mais emocionante: "Mexeu muito comigo"

Em Amor Perfeito, Marcelino (Levi Asaf) tem contrariado os padres indo ao sótão atrás de Jesus Cristo. Sempre que pressente a presença do menino, o Senhor deixa a Cruz para ficar mais perto dele.

Somente a criança é capaz de vê-lo e ouvi-lo na forma de um homem. Além de enchê-lo de perguntas, o inocente lhe dá de comer e beber assim como no filme espanhol Marcelino, Pão e Vinho, lançado em 1955, que serviu de inspiração para a novela das seis da Globo.

O NaTelinha foi atrás de Jorge Florêncio, intérprete do personagem na obra escrita por Duca Rachid, para saber mais sobre esse trabalho e a sensação de dar vida ao primeiro Jesus negro da televisão brasileira.

Confira a entrevista!

NaTelinha: Como surgiu o convite para viver Jesus em Amor Perfeito?

Jorge Florêncio: Eu fui chamado pela produtora de elenco Marcella Bergamo para um teste. Fiz e passei, mas de novembro de 2022 a equipe entrou em contato comigo e disse que o perfil do personagem havia mudado e que, infelizmente, eu não poderia mais fazer parte do elenco. Em janeiro, a produção fez um novo contato me sondando para outro personagem. Eu estava ensaiando para sair em turnê com um musical e não deixaria a peça se não fosse algo de relevância na novela.

Então o diretor artístico, André Câmara, me ligou convidando para fazer ninguém menos que Jesus. Eu, é claro, aceitei de cara. Um misto de muitas sensações, muita alegria, emoção, e uma certeza… “deixa estar, que o que for pra ser vigora”. Não estamos sozinhos e tudo tem seu tempo pra acontecer, não o nosso tempo, mas o tempo do Divino, e acontece. A fé é e sempre será minha grande aliada.

NT: Você teve algum receio quanto ao papel?

Jorge Florêncio: Eu tive sim. Afinal, dar vida a Jesus Cristo, o homem mais amado de toda história, tem seu peso. Jesus não pode errar. Então, é tudo milimetricamente pensado nas cenas, cada entonação, colocação de voz, gestos, sorrisos, piscadas, tudo é dirigido para que se entregue um resultado crível e afetuoso ao público. Meu maior receio era e tem sido esse, proferir as palavras dos textos brilhantemente escritos pela Duca Rachid, Elísio Lopes Jr e Júlio Fischer, com o maior cuidado e carinho a que o personagem pede. Ser amor, ser empatia, ser acalanto, esses são meus reais desafios.

NT: Qual a sensação em interpretar o primeiro Jesus negro na televisão brasileira?

Jorge Florêncio: Quando o André [diretor] me ligou e contou qual seria o personagem, minha cabeça deu um nó, um misto de medo e alegria. Alegria pelo fato de estar na TV Globo, uma das maiores emissoras do mundo, a melhor no assunto teledramaturgia e fazendo Jesus, fugindo de todo e qualquer eurocentrismo no qual há séculos e séculos nos impuseram como verdade absoluta. Uma imensa alegria em fazer Cristo, o homem que não só foi o mais amado na história da humanidade como é a personificação do próprio Amor, um prato cheio para qualquer ator. É uma honra e responsabilidade muito grande. Já faço o gancho com o medo que mencionei acima, assim como nem o próprio Jesus agradou a todos, é provável que eu também não agrade. Quando nós, artistas, nos expomos, de uma certa forma queremos, sim, aprovação, mas esse desejo não está ao nosso alcance.

Então, nos cabe a tarefa de executar nossa arte imbuídos de nossa verdade, a fim de que nosso discurso atinja ao máximo de pessoas, e sabemos que o todo é bem difícil de alcançar… Mas que seja útil e transformador aos que se permitirem entrar em contato com nossa arte, no meu caso, com a minha leitura de Jesus Cristo em Amor Perfeito. É uma imensa responsabilidade, eu, um ator nascido e criado no subúrbio carioca, em Del Castilho, dar vida a Jesus Cristo. É de uma gigantesca representatividade ser visto por pessoas que assim como eu, pardas e pretas, não tinham referências de santidades dentro do cristianismo ou nas grandes produções com temáticas cristãs. O que víamos e ainda vemos são imagens de anjos, Santos e Santas sempre no estereótipo da pela clara. Poder, nos dias de hoje, viver um Jesus não eurocêntrico numa novela, dentro de uma emissora com grande alcance e poder de influência como a TV Globo, é de grande relevância para sociedade como um todo. O cuidado e delicadeza em que a nossa novela é brilhantemente escrita por Duca Rachid, Elísio Lopes Jr. Júlio Fischer, e dirigida sensivelmente pelo André Câmara, trás essa pluralidade e diversidade a nossa trama, tornando a obra singular.

NT: Alguma preparação especial para o personagem?

Jorge Florêncio: André [diretor artístico da novela] me pediu que emagrecesse para viver o papel. Desde então, minha rotina de treinos se modificaram. Deixei de ir com tanta frequência a academia e passei a focar nos treinos mais curtos e com menos carga. Meu objetivo era ficar menor e com corpo menos marcado… Ainda sigo nesse ritmo, já perdi quase 10kg. Sempre gostei de treinar muito e pesado, claro, com orientação de profissionais, mas nesse período tive que abrir mão da vaidade em prol do trabalho. Assim que soube que faria Jesus, logo busquei entender um pouco mais sobre o evangelho.

Sempre achei uma leitura difícil e confusa, e mesmo sabendo que a temática central da novela não é sobre passagens bíblicas em si, julguei importante fazer esses estudos por conta própria e, pra isso, conto ainda hoje com as orientações do meu amigo e estudante de teologia, João Marcos Freitas, que também é artista e músico. Nossos diálogos são sempre leves, descontraídos, cercados de humor e acompanhados de um forte café, que não dispenso [risos]. Nunca imaginei que falar do evangelho poderia ser tão divertido e enriquecedor pra mim enquanto artista e ser humano.

NT: Você é uma pessoa religiosa?

Jorge Florêncio: Eu tenho muita fé e costumo dizer que não tenho religião. Sou nascido e criado dentro do cristianismo, fui batizado e fiz primeira comunhão. Inclusive, sou devoto de São Jorge. Porém, acredito em muitas outras formas de expressar a fé, que vão pra além de templos, casas e igrejas. Pra mim, Deus está em todos os lugares e, principalmente, dentro da gente. Acredito que a conexão com a fé, com o divino, parte em primeiro lugar de dentro da gente, do nosso coração. A comunhão com Deus é intimista e se manifesta diariamente a nossa volta… Seja através da natureza, dos ventos, sol, chuva… De um bom dia! Basta a gente estar aberto e preparado para perceber essas manifestações constantes no nosso entorno. Deus se comunica com a gente através do outro, é só a gente aprender a ouvir.

NT: E como tem sido contracenar com Levi Asaf? Esse menino tem futuro, não?

Jorge Florêncio: O Levi [Asaf] é um amor, muito talentoso e carismático. Arranca sorrisos por onde passa e ilumina sempre com sua chegada! Busco sempre me conectar com o olhar dele pra que, de algum modo, as lentes da câmera captem nossa relação, essa pureza é essencial para nossas cenas e tenho certeza que em algum lugar isso chega ao grande público. Sempre que estamos juntos, nos bastidores, a gente busca essa interação que, sem dúvidas, influencia muito nas cenas. Guardem esse nome, Levi Asaf. Essa história com esse talento só está começando!

NT: As cenas com Marcelino e Jesus têm emocionado bastante o público. Você destacaria alguma em especial? Por quê?

Jorge Florêncio: Difícil! [risos]. Destacaria as sequências do milagre de Jesus descendo da Cruz, Marcelino retirando a Corão de espinhos de Jesus… São momentos que mexem muito comigo enquanto ator e ser humano, sair da Cruz para conversar com um menino que tem um grande sonho e agir para que esse sonho se concretize é de uma poesia inexplicável. Pensar que Jesus Cristo só morreu crucificado em sacrifício a humanidade e, ainda assim, “segue descendo da Cruz” para estar conosco, atendendo nossos desejos, sendo amor em nós…

É uma prova sem tamanho do seu amor, mesmo ele sendo Cristo e não tendo que provar nada pra ninguém. De fato, são momentos que me fazem refletir sobre amor, compaixão e amadurecer muito a minha fé. Destacaria também as sequências que estão por vir após o capítulo 100, são bastante emocionantes.

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