Alinne Moraes fala que sexo com hora marcada blinda casamento da rotina: ‘Temos um dia’
Atriz, que está de volta às novelas em ‘Guerreiros do Sol’, do Globoplay, explica como mantém o filho longe das redes, o que a ajudou a ressignificar a rejeição paterna por que não curte ‘bombar’ a própria imagem: ‘Ao me resguardar, tenho mais liberdade, mais vida’
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20/04/2025 04h30 Atualizado agora
Sex symbol, modelo promissora, musa das novelas e das capas de revistas, dona da boca mais bonita do Brasil e alvo constante dos paparazzi nos tempos de outrora. Em quase três décadas de carreira, Alinne Moraes protagonizou campanhas para marcas como Animale, L’Oréal e Arezzo, fez mais de dez folhetins na TV Globo e teve a vida privada e os romances devassados, algo comum a grandes estrelas. “Isso me assustava. Quando namorei o Cauã (Reymond, de 2002 a 2005), éramos dois jovens fazendo sucesso, havia muito assédio. Na separação, foi igual. Na época, não estava em nenhuma novela. Não queria ser aquela personagem”, relembra a atriz, de 42 anos, em entrevista por chamada de vídeo.
Prestes a voltar à dramaturgia na trama “Guerreiros do Sol”, com estreia prevista para o segundo semestre no Globoplay, como a ativista feminista Jânia, Alinne virou o jogo. Desprendeu-se de alcunhas que limitavam sua beleza aos atributos físicos e se consagrou um dos maiores talentos de sua geração. Interpretou papéis marcantes: a estudante lésbica Clara, de “Mulheres apaixonadas” (2003), a obsessiva vilã Silvia, de “Duas caras” (2007), a modelo tetraplégica Luciana, de “Viver a vida” (2009) e a mocinha Lívia, em “Além do tempo” (2015). Mas, a cada ano, foi se tornando mais seletiva profissionalmente. “Gosto do mistério. Não quero ser falada ou lembrada, deixo isso para as personagens. Por isso, não trabalho todo ano. Tenho mais liberdade, mais vida”, diz a paulista de Sorocaba.
Avessa a badalações, à oferta de “publis” e à visibilidade das redes sociais, Alinne compreendeu, na terapia, o que a realizava. Principalmente ao se tornar mãe de Pedro, de 10 anos, da relação com o diretor Mauro Lima, de 57. “Meus sonhos estão concentrados na família e só no que me desafia como atriz”, garante. Leia os melhores trechos da conversa em que ela disseca as dores da rejeição ao ter crescido sem pai e como as ressignificou; fala da criação feminista, da prática de “agendar” o dia para transar, sem deixar a rotina engolir o casamento, e como cria o filho para lidar com os conteúdos tóxicos e misóginos da internet.
Quem é a personagem de “Guerreiros do Sol”?
A novela se passa no Sertão Nordestino, nas décadas de 1920 e 1930, quando a maioria das mulheres era propriedade dos homens. Jânia vive um casamento arranjado, é muito calada, mas herda uma biblioteca. Lê a escritora francesa Colette, a filósofa Rosa de Luxemburgo e a brasileira Nísia Floresta. Com o tempo, se liberta e se torna uma grande ativista.
Há uma volta do conservadorismo na política e crescem os discursos de ódio nas redes. O feminismo tem dificuldades para avançar?
Evoluímos, ainda há muito a conquistar, mas sou otimista. O fato de o nosso corpo não ser “nosso” e de termos medo de sair às ruas são questões atuais a se debater. A extrema-direita avança, dificulta as coisas, mas não há como retroceder. A internet amplia o discurso e conseguimos nos comunicar melhor.
Você foi criada por sua mãe e sua avó. no que elas foram mais essenciais à sua formação?
Meu avô faleceu quando minha mãe tinha 4 anos, e minha avó a criou sozinha, sem ajuda. Aos 18, solteira, minha mãe engravidou de mim. A história se repetiu. Só pude ser modelo e morar fora do Brasil por causa delas. Se houvesse um homem, no contexto machista da época, isso poderia ter dificultado minha liberdade. Minha mãe foi corajosa, largou tudo para me acompanhar e viu na carreira a oportunidade de mudar nossa realidade.
Como ressignificou a ausência paterna?
Com terapia. Comecei aos 14 anos, quando era modelo. Nasci sem uma parte de mim. Quis preencher a presença masculina dele com ele mesmo, e consegui. Aos 22, tivemos um único encontro, e meses depois, ele faleceu. Conversamos uma madrugada toda, precisava disso, e me senti mais leve. Mas percebi que não tínhamos nenhuma afinidade. Na infância, eu não pensava muito sobre isso, era uma forma de me proteger. Depois, consegui entender que ele tinha culpa.
Você já declarou várias vezes ser insegura. Tem a ver com o sentimento de rejeição?
A insegurança é um traço da minha personalidade. A rejeição masculina, do meu pai, uma família desestruturada, gerou tudo isso. Terapia é para sempre. Na moda ouvi muitos “nãos”. Parece que sempre estou passando por uma avaliação, e fico em um estado de constante alerta.
Sua história a fez repensar a maternidade?
Sempre sonhei em ser mãe. Queria ter essa experiência e poder dar um pai para o meu filho. E é tudo novo, me preenche em algum lugar, me emociona a relação do Mauro com o Pedro. Ele é um pai muito presente.
A série “adolescência” mostra a relação dos meninos com as redes sociais e os discursos misóginos. Fala sobre isso com o Pedro?
Assisti à série, fiquei triste e preocupada. Meu filho é o único na classe que não tem celular. É uma briga diária, são muitos “nãos”. Conversamos sobre educação sexual, desigualdade, racismo. Ele sabe que (as redes) estão adoecendo os amigos. Quando Pedro precisa usar a internet para uma pesquisa, estou ao lado dele.
Como incluir os meninos em uma educação feminista?
Com conversa e empatia. As crianças são ansiosas, não sabem se relacionar porque ficam na tela o tempo todo. Quando você não vê o outro, não se coloca no lugar dele. Mostro o quanto as mulheres brigam pela igualdade. Pedro vai fazer 11 anos. Outro dia, eu disse: “Filho, agora é um momento de transformação, dos hormônios mudando. Não aponte o corpo das meninas, não comente”.
Você se voltou para a família quando Pedro nasceu. Foi uma escolha não estar tão em evidência na profissão, nas redes sociais?
Fi natural diminuir o ritmo. Aos 42, quero escolher o que faço, não trabalhar todo ano. Estar em evidência não me realiza. Não quero ser falada ou lembrada, deixo isso para as personagens. Gosto do mistério. Saio de chinelo de dedo, com o cabelo preso, compro pão, levo meu filho à escola, tudo tranquilamente. Ao me resguardar, tenho mais liberdade, mais vida.
Li que você já disse se sentir culpada por ser bonita. Por quê?
Devo ter dito isso quando fiz “Dorotéia” (espetáculo de Nelson Rodrigues que aborda a relevância da beleza), em 2017. Não é bem uma culpa, mas a beleza abre portas e te deixa estereotipada, te enquadra em um lugar meio bobo. Não é só o que tenho para mostrar. Escuto: “Você está disfarçada, sem maquiagem, de óculos?”. Sempre usei óculos. Não posso deixar que meu nome só esteja ligado à beleza. Me diminui muito como mulher. É como se eu tivesse que mostrar e provar que sou boa em algo além da minha beleza, sabe?
Você e o diretor Mauro lima estão juntos há 13 anos. São o monogâmicos?
Sim, nunca pensamos em relações abertas. Nos cercamos de outras pessoas, mas fazemos tudo juntos. Eu o admiro, Mauro escreve maravilhosamente bem, entende o ser humano, a vida.
E não tem algo de ruim em fazer tudo junto?
Não, ele é meu melhor amigo, e a amizade é uma das coisas mais importantes. Mesmo com um filho, não perdemos os momentos a sós. Quando amigos comentam que pensam em se separar, porque não há mais uma relação sexual em razão da rotina, dos problemas, digo: ‘Marque um dia!’. É importante. Nós sempre tivemos esse dia. Sou mais completa com ele, e não é clichê. Já passaram homens muito ruins pela minha vida, e ele foi selecionado a dedo.
Então, já viveu relações abusivas e tóxicas?
Muitas, infelizmente. Minha mãe viveu também, e eu estive presente. Foi difícil de ela sair, porque a vítima fica doente, não tem forças. Eu era criança e não consegui ajudá-la. Não quero dar detalhes, para não expô-la. Mas a mãe é um espelho da gente. Por sorte, tive consciência. Quando o cara tinha alguma atitude estranha, eu já caía fora.