A vontade inicial de Andréa Beltrão era ficar em cartaz com “Lady Tempestade”, no Teatro Poeira, em Botafogo, Zona Sul do Rio, por quatro meses. Mas a temporada foi encurtada para apenas um, porque os ensaios para “No rancho fundo” já começaram. Na próxima novela das seis da TV Globo, prevista para estrear em abril, a atriz viverá uma nordestina arretada, mãe de seis filhos.
— Zefa Leonel é a mãe de Quinota (Larissa Bocchino), a mocinha invocada e nada açucarada da trama. Minha personagem é casada com Tico Leonel (Alexandre Nero) e tem uma relação amorosa com ele. Mas sai no braço com outros homens, não tem medo de nada — adianta Andréa, encantada com a fábula de Mário Teixeira, que será uma espécie de continuidade de “Mar do sertão”, novela de 2022 também escrita por ele (atualmente, a artista ainda pode ser vista nas tardes da emissora como a espevitada Tônia, de “Mulheres de areia”).
Andréa Beltrão e o filho, Chico BF, em cena na peça “Lady Tempestade” — Foto: Divulgação
No teatro, a carioca traz à tona a coragem de outra nordestina: a advogada pernambucana Mércia Albuquerque (1934-2003), que defendeu centenas de presos políticos, principalmente entre 1973 e 1974, um dos períodos mais pesados da ditadura brasileira. Por coincidência, a peça estreia no ano em que os 60 anos do golpe militar são lembrados no nosso país.
— Quando eu e Yara (de Novaes, diretora) começamos a procurar o que produzir juntas, um ano atrás, essa efeméride não estava no nosso radar. Em meio aos ensaios, alguém nos alertou, e foi uma surpresa. Nós não procuramos fazer um teatro de causa, aproveitando esse aniversário fatídico e maldito — afirma Andréa, que também tem 60 anos de idade e concedeu esta entrevista no último dia 8 de janeiro: — Na justiça divina, eu não sei se acredito. Se ela existe, está devendo, porque são tantas coisas terríveis, tristes e trágicas! Mas na dos homens, eu preciso acreditar. Há exatamente um ano, foi a Justiça que nos tirou daquele pavor (a invasão de golpistas às sedes dos Três Poderes, em Brasília, com depredação do patrimônio público). Eu nem sei o que estaríamos vivendo agora se o Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Lula e o ministro da Justiça Flávio Dino não tivessem atuado de maneira tão rápida e eficiente.
“Lady Tempestade” é tratado como monólogo, mas Andréa não está sozinha em cena. Primogênito entre os seus três filhos com o diretor Maurício Farias, Francisco, de 28 anos, assina como Chico BF a criação e operação de trilha sonora do espetáculo. De quebra, ainda contracena com a mãe.
— Ele é produtor musical e acabou de voltar ao país, depois de muitos anos estudando fora. Nunca pensei em convidá-lo para estar em cena comigo, isso veio da cabeça genial da Yara. E como o recorte da peça é em cima da relação afetuosa de mães e filhos (presos e torturados), estar ao lado do meu me emociona ainda mais — conta a atriz: — Chico topou o desafio de cara, mas já avisou: “Yara, quando você quiser me chamar para fazer trilha, faço até de graça. Só não quero mais ser ator. Desta vez, só porque é com minha mãe” (risos).
Andréa Beltrão e o filho mais velho, Francisco — Foto: Nana Moraes/Divulgação
Assim como a personagem central e real do espetáculo teatral, Andréa Beltrão também se considera uma “Lady Tempestade”.
— Só que eu não tenho tanta coragem quanto Mércia… Só um pouquinho (risos). Sou de me jogar nos desafios. Mas acho que estou mais para tempestade de verão, porque adoro praia, nadar no mar, correr e jogar bola na areia, tomar sol. Tenho verdadeira paixão por essa vida no Rio — explica a moradora de Copacabana, que diariamente se exercita na orla: — Faço ginástica de manhã cedo, vou nadar por volta das 9h e jogo altinha até umas 11h, 11h30. Nado até o fundão do mar, mas não me atrevo a ir sozinha. Faço parte da Equipe 15, que tem bombeiros guarda-vidas como professores. Eles nos acompanham de prancha de stand up paddle (SUP), é uma segurança absoluta.
A carioca diz que se sente mais bonita agora, aos 60, do que na juventude. E garante que não se rende às harmonizações estéticas:
— A cara que eu tenho é essa, vou com ela até o fim com as marcas que forem se impondo. O que eu quero é me sentir forte na vida o maior tempo possível. Gosto de poder me levantar rapidamente de uma cadeira sem dores, ter fôlego nas minhas atividades. Eu me sinto muito jovem, embora não seja.
Andréa Beltrão como Tônia, em “Mulheres de areia”: reprise na Globo — Foto: Marcos André Pinto/Agência O Globo/20.10.1992
Outros filhos nas artes
Os outros dois filhos de Andréa e Maurício são Rosa, de 26 anos, e José, de 23. “E eu ainda tenho um enteado, Antônio, de 32 anos. Rosa é escritora, está cursando Letras (ela lançou no ano passado o livro “Em algum lugar, em algum ano”, sobre a vida do tio Artur, irmão caçula de Andréa, que morreu com um aneurisma, antes que pudesse conhecê-lo). E José está fazendo Unirio, trilhando o caminho dele como ator também. Apesar de mãe, sou muito crítica, então falo com certa liberdade que acho que ele vai ter uma carreira bacana”, avalia.
Andréa Beltrão sendo dirigida pelo marido, Maurício Farias, na série “Cidade Proibida”: parceria na vida e na arte — Foto: Cesar Alves/Rede Globo/Divulgação
Na vida e no trabalho
O casamento da atriz com o diretor já dura três décadas: “A gente tem paixão, admiração e respeito mútuos. Compartilhamos a vida de uma maneira legal, alegre. Cada um tem seus interesses, mas a gente ama trabalhar junto. Ama! E nossa relação no trabalho é muito interessante: eu o chamo de Senhor e ele me trata como De Beltrão. Não tem querida, meu amor, meu bem, minha gata… Deus que me perdoe! Se ele falasse assim comigo um dia, acho que eu fugiria. Nem eu falo: ‘Meu amor, é mais pra direita ou mais pra esquerda?’. E damos espaço para interagirmos com as outras pessoas do set”.