Quando “Vale tudo” foi ao ar em 1988, a figura da empregada doméstica refletia muito mais as marcas do Brasil escravocrata. Na época, tínhamos em cena Zezé (Zeni Pereira), uma senhora negra que estava sempre pronta para servir o clã de Bartolomeu (Cláudio Corrêa e Castro) a qualquer hora do dia ou da noite.
Na trama, ela conseguia uma folga de vez em quando para visitar um parente doente, e sua presença era considerada indispensável, mesmo em meio à crise financeira dos patrões. A ideia de uma família, especialmente de classe média, abrir mão desse tipo de serviço não era cogitada.
Trinta e sete anos depois, esse cenário mudou, e isso se reflete no remake de Manuela Dias. Zezé sequer existe na nova versão. O próprio Bartolomeu (Luis Melo), que antes não fazia nem uma tarefa doméstica, agora assume funções na cozinha, preparando refeições para a mulher, Eunice (Edvana Carvalho), por exemplo.
Nas últimas décadas, principalmente a partir da aprovação da PEC das Domésticas, em 2013, essas trabalhadoras conquistaram direitos básicos.
A diarista Lucimar é outra que ilustra essa transformação. Na década de 80, interpretada por Maria Gladys, servia como alívio cômico: uma faxineira com tiradas escrachadas, cuja função era divertir, sem trama própria. No remake, a personagem interpretada por Ingrid Gaigher mantém o bom humor, mas ganha densidade. Ela é uma mãe que precisou acionar a Justiça para garantir que Vasco (Thiago Martins) pagasse a pensão do filho.
Mordomo Eugênio de ‘Vale tudo’ é confidente de Heleninha
Ainda assim, existe a figura do mordomo Eugênio (vivido hoje por Luis Salem), que segue dormindo na casa da família Roitman, capaz de arcar com os custos do funcionário.
Fato é que o remake não só atualiza tramas e personagens, mas funciona como um espelho das transformações sociais que redesenharam as relações do trabalho doméstico no Brasil.
Quem era o mordomo Eugênio na primeira versão de ‘Vale tudo’?
Na versão original, o mordomo Eugênio (Sérgio Mamberti) era apaixonado por cinema americano das décadas de 1930 a 1950 — e vivia citando filmes e cenas. Na nova versão, o personagem não carrega mais essa característica, mas continua surgindo na tela para levantar a autoestima da patroa Heleninha.
Teve empregada vendo patrão no banho em ‘Vale tudo’? Teve, sim!
Em 1988, Daisy (Nara Abreu), a copeira e arrumadeira do apartamento de Marco Aurélio (Reginaldo Faria), chegava a entrar no banheiro enquanto o patrão tomava banho, tudo para cumprir suas ordens. Ela ainda era assediada pelo motorista. Na nova versão, a relação da funcionária com o vilão não tem qualquer traço dos abusos vistos no passado.
Qual o final de Lucimar em Lucimar em ‘Vale tudo’?
Dificilmente a Lucimar de agora terá o mesmo desfecho cômico da trama original. Ela ficava rica ao ganhar no jogo do bicho e ressurgia com um penteado à la Odete Roitman contando que vivia em Mar del Plata, na Argentina, destino considerado glamouroso na época.